postado em 09/07/2018 9:35 / atualizado em 10/07/2018 17:30
A proximidade das Eleições Gerais, aliada ao anseio nacional pela construção de um sistema tributário mais justo, simples e menos oneroso, colocam o tema reforma tributária novamente no centro do debate político e econômico do país.
Com várias propostas em discussão, é importante alertarmos que um modelo com bons resultados em um país poderá não ter o mesmo desempenho em outro. Nas argumentações sobre a reforma tributária, utiliza-se, em muitos casos, comparações com sistemas vigentes em outros países com pouca ou nenhuma semelhança com o Brasil. Esse tipo de estudo, invariavelmente, agrega componentes ou conclusões perigosas quando se propõe uma nova forma de arrecadar os tributos.
CARGA TRIBUTÁRIA, DESENVOLVIMENTO E EMPREENDEDORISMO
Com 32,6% sobre o PIB, o Brasil possui uma carga tributária superior à de muitos países desenvolvidos, membros da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) como, por exemplo, o Canadá (30,82%), a Suíça (26,65%), os EUA (26%) e o Chile (19,82%).
Nessa vertente, uma importante discussão emerge, envolvendo a relação tributação x desenvolvimento. Afinal, a tributação promove o desenvolvimento ou é o desenvolvimento que pode proporcionar uma política tributária mais justa? Os dados de carga tributária x PIB brasileiro dão uma pista. Se a primeira assertiva fosse válida, o Brasil seria um dos países mais desenvolvidos do mundo, já que estamos bem à frente dos Estados Unidos em termos de carga tributária.
Essa discussão deve se basear em dados confiáveis e que levem em conta outras variáveis como renda per capita, área geográfica e participação das camadas da população em cada uma das bases de tributação. Isso significa dizer que ainda há muito o que estudar e propor sobre o tema, mas temos que ter cautela para não comparar sistemas distintos, propondo soluções baseadas em realidades completamente diversas da nossa.
O Brasil é o 5º maior país do mundo em termos populacional e territorial. Com mais de 8 milhões de Km2 de área e população de 207 milhões, fica atrás somente de China, Índia, EUA e Indonésia, nesse último quesito.
Para que possamos vencer o desafio de aprimorarmos o modelo de tributação, devemos buscar mudanças com vistas a gerar uma melhor distribuição de renda. Para tanto, é preciso focar na construção de um ambiente favorável à geração de novos postos de trabalho. Essa era a defesa que o ex-presidente Reagan fazia quando afirmava que “o melhor programa social é um emprego”.
Contudo, nossa legislação acaba gerando um ambiente hostil à instalação e desenvolvimento de empresas. Desde a superposição de competências em marcos regulatórios – como a legislação ambiental, por exemplo – até a pesada burocracia Estatal para se abrir, desenvolver e fechar negócios.
Nesta perspectiva, somos um dos piores países do mundo para se empreender. Em 2017, o Banco Mundial divulgou o ranking dos países do mundo para se fazer negócios e o Brasil ocupa vergonhosamente a 125ª posição na lista. Quando esse estudo avalia a dificuldade em se pagar tributos, o Brasil somente fica à frente de países como: Congo, Bolívia, República Centro-Africana, Chade, Venezuela e Somália.
TRIBUTAÇÃO SOBRE A RENDA DO TRABALHO
Dados publicados pela Receita Federal sobre as declarações de rendimentos comparados com dados demográficos no Brasil, apontam para o seguinte quadro:
O panorama acima indica que a capacidade de gerar aumento de arrecadação pelo aumento da tributação sobre a renda do trabalho tenderia a causar uma sobrecarga de tributação ainda maior sobre parte da classe média.
Os trabalhadores que compõem essa faixa de rendimento ainda vêm suportando a absoluta inércia do governo federal no reajuste das faixas de incidência da tabela do IRPF, sobretaxando – pelo avanço inflacionário – os contribuintes que já contribuíam e sugando para a tributação uma parcela da população que contribuía até há alguns anos.
Esse tipo de omissão acarreta – de fato – uma elevação da carga tributária sem a devida autorização legal. O Sindifisco Nacional afirma que a inflação acumulada desde 1996 – quando a tabela foi atualizada pela última vez – já alcança 88,4%. A omissão acarreta – de fato – uma elevação do tributo sem a devida autorização legal.
AGRONEGÓCIO
O Brasil tem no agronegócio um de seus setores de atividade econômica que mais vem gerando ganhos de divisas e de competitividade internacional. O brasileiro ocupa o 4º lugar mundial no ranking de produtores de alimentos. Em 2017, o país colheu uma safra recorde de 242 milhões de toneladas e – de quebra – ajudou nossa economia a manter um superávit em sua balança comercial.
Há defensores de que elevemos a tributação ambiental, com tributação mais incisiva – direta ou indiretamente – sobre a atividade de agronegócio. Mas o caminho a percorrer deve ser exatamente o inverso.
O país deve destinar mais apoio à pesquisa, ao desenvolvimento e à assistência técnica, especialmente ao micro produtor rural, que responde por grande parte da fixação do homem no campo. Além disso devemos evoluir para estimularmos mais fortemente a agregação de valor nesta cadeia produtiva, pela industrialização da produção.
Dados do último censo agropecuário do IBGE (2007/2006) revelam que a atividade rural no Brasil é formada por 5.204.130 estabelecimentos. Ocupa área superior a 354,8Mi de ha. Com mais de 19 milhões de pessoas trabalhando no campo, o país é um dos gigantes mundiais da produção no setor. E a atividade como um todo ocupa todos os níveis de produção, do micro ao grande produtor agropecuário.
O Brasil tem no agronegócio o seu passaporte para o futuro, já que possui a maior área agriculturável do planeta. Sobretaxar as atividades relacionadas ao agronegócio será o mesmo que “matar a nossa galinha dos ovos de ouro”.
O desenvolvimento do agronegócio brasileiro poderá aproveitar uma janela de oportunidade que se abre com a mobilidade social que acontece na China e na Índia, onde estima-se que 700 milhões de trabalhadores nesses países mudarão de classe social e, mais ricos, passarão a demandar por mais alimentos, impactando positivamente a nossa economia – via agronegócio.
Defendemos que o desenvolvimento do agronegócio – em todas as suas escalas e atividades – deve respeitar técnicas cientificamente reconhecidas como sustentáveis e que preservem o meio ambiente e a própria atividade. Mas a questão de regulação – nessa esfera – não pode sofrer intervenção tributária. Esse não é um papel reservado à tributação.
Pensamos sim, que toda e qualquer iniciativa de majoração de tributos em atividades produtivas tende a retirar empregos. Dizima postos de trabalho. Piora ainda mais a distribuição de renda e acaba por produzir ainda mais distorções no atual sistema.
TRIBUTAÇÃO SOBRE O CONSUMO
Para o Brasil, o modelo de tributação sobre o consumo é o mais viável para financiar as atividades dos Estados. Há formas de reduzirmos e até anularmos a regressividade, preservando um IVA que atenda as demandas da sociedade e ao mesmo tempo respeite as características geográficas, demográficas e sociais do país. Há propostas inteligentes de simplificação e evolução desse modelo que é o mais bem-sucedido e importante tributo que o país já foi capaz de elaborar.
Somos contrários às críticas que se fazem ao ICMS. Defendemos que o ICMS evolua para um IVA que simplifique as formas de apuração e recolhimento, ancorado em novas tecnologias como o Blockchain, que permite – via inputs de smart contracts – eliminar a maior parte do custo de cálculo e recolhimento. Esse tipo de inovação reduzirá o custo de compliance para as empresas e nos permitirá entregar ao setor produtivo uma nova realidade tributária, menos onerosa ao contribuinte e mais eficiente para o Estado.
O que não podemos é cair na tentação de simplesmente propor ainda mais carga tributária ao nosso ambiente concorrencial. Isso afasta o emprego e piora a distribuição de renda. Somos contrários a tal corrente de pensamento e queremos deixar isso bem claro. Este é o nosso posicionamento.
Esse ecossistema confuso, caro e ineficiente acaba por gerar as condições perfeitas para uma futura rebelião tributária. Os sinais já estão aparecendo, como foi o caso do recente episódio da greve dos caminhoneiros.
Enfim, o que poderemos extrair dessa realidade é que o nosso principal foco na construção de um novo Sistema Tributário Nacional é de que o novo modelo deve respeitar o pacto federativo e acompanhar as mudanças nos cenários econômico e tecnológico mundial, pois boa parte das leis aprovadas na década de 1960, não atende mais às demandas dos negócios, principalmente nessa nova realidade de desmaterialização de parte da Economia.
É essencial a construção de um ecossistema de geração de negócios que aproveite nossos potenciais geográficos e tecnológicos, em uma nova realidade de justiça social, na repartição de competências e receitas entre os entes federados conforme suas características, de forma a simplificar a tributação, onerando menos a população.
Ao oferecermos mais condições para que a atividade empresarial evolua, contribuiremos para a geração de mais empregos, renda, riqueza, e consequentemente, mais recursos tributários.
O BRASIL E O MUNDO EM NÚMEROS – ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
Se construirmos uma tabela comparativa levando em conta as variáveis população, área, carga/PIB e status de desenvolvimento, temos a seguinte realidade:
Fica patente que o único país com população acima de 200 milhões de habitantes que é considerado desenvolvido são os EUA. Outra conclusão é a de que dentre os 6 países mais populosos do mundo, o Brasil é o que possui a maior carga tributária.
Esse tipo de conclusão se constitui em uma das variáveis que necessariamente têm que ser levadas em conta para a construção de proposta para um novo Sistema Tributário Nacional.
E se pesquisarmos dentre os países com população superior à de 100 milhões e inferior à de 200 milhões de habitantes, teremos a seguinte situação:
A partir da leitura da tabela acima, identificamos que o único país do mundo com população inferior à de 200 milhões e superior à de 100 milhões de habitantes com status ‘desenvolvido’ é o Japão. Essa constatação é necessária para que evitemos comparar realidades demográficas e geográficas distintas com a nossa, propondo soluções que muito provavelmente seriam mais danosas que favoráveis à nossa economia.
CARGA TRIBUTÁRIA X RETORNO À SOCIEDADE
O índice IRBES – Índice de Retorno de Bem Estar à Sociedade utiliza os dados da Carga Tributária/PIB e do IDH – Índice de Desenvolvimento Humano. O Brasil ocupa a 30ª posição num ranking de 30 países. Vejamos um recorte desse ranking, combinado com outros dados, na tabela abaixo:
O que é comum a todas as economias acima listadas, dentre as 10 mais bem ranqueadas no IRBES é a relação PPC, onde todas as que estão no topo da lista possuem o indicador PPC acima de US$ 26.000,00. Além disso, todos esses países tributam em nível inferior ao Brasil.
Importante para termos ciência de que não é aumentando a carga tributária que elevaremos a qualidade de vida de nossa população. Tampouco que ao majorarmos a tributação no país estaremos contribuindo para gerar um ambiente mais propício ao desenvolvimento.
Fica evidente que o aumento da renda per capita é – por óbvio – redutor das desigualdades sociais, da pobreza e consequência de um ambiente favorável ao desenvolvimento.
Comparando os Estados Unidos e o Brasil, já que se parecem em tamanho de área e quantidade de habitantes, temos:
Os dados evidenciam que o único país do mundo a vencer o desafio de conciliar o tamanho continental de sua área com baixa tributação e desenvolvimento social foi os EUA. Os demais países com grande área geográfica e população acima dos 200 milhões de habitantes são todos aqueles que ainda não ainda atingiram o estágio de desenvolvimento econômico.
BRASIL – CENÁRIO ATRAI OU AFUGENTA?
Dados da Receita Federal sobre a quantidade de pessoas físicas que têm feito declaração de saída definitiva do Brasil apontam que – de 2011 a 2017 – esse número quase triplica. É óbvio que a quantidade de brasileiros que está deixando o país é muito maior que essa, já que poucos são os que declaram renda ou elaboram esse tipo de declaração específica.
Devemos cuidar para não afugentarmos novos investimentos em forma de empresas e empregos. E zelar por uma conjuntura que não afugente cérebros para outras economias mais estáveis, o que condenaria o país a ainda mais atraso.
Essa situação é ainda mais crítica se pensarmos que o mundo ingressa numa nova fase de desmaterialização da Economia, onde a sede de uma determinada empresa pode – em tese – estar na nuvem.
TRIBUTAÇÃO DE LUCROS, GRANDES FORTUNAS E CONSIDERAÇÕES FINAIS
Na discussão que se faz sobre a elevação da tributação de dividendos e lucros, concordamos que há – de fato – espaço para evoluirmos nessa direção. Trata-se de uma questão de justiça fiscal. Contudo, o Estado brasileiro não tem legitimidade – hoje – para propor tal avanço. Não antes de simplificar e reduzir o custo do atual sistema.
Na América Latina e Caribe, o Brasil é o campeão em termos de Carga Tributária. Todos os demais países possuem carga inferior à nossa.
As empresas que operam no Brasil já suportam um dos maiores custos de compliance do mundo. Esse ‘custo tributário’ indireto deve ser mitigado para que em seguida possa ser aplicado à zona de tributação. Essa seria uma atitude que sinalizaria para o ambiente de empreendedorismo mais racionalidade e agregaria legitimidade a uma evolução nesse tópico.
Ao resolver tal questão, ideal seria que a tributação sobre a renda do trabalho sofresse uma redução, desafogando a classe trabalhadora e recompondo seu poder de consumo. Esse seria um movimento combinado com uma eventual movimentação para tributar lucros e dividendos.
Já a questão da tributação de grandes fortunas parece-nos muito mais fácil de defender – via discurso de jogar para a plateia – do que geraria efeitos práticos e benéficos para o país. Há exemplos de países pelo mundo, como a Alemanha, que abandonaram a referida tributação ao perceberem a baixa efetividade e o potencial de prejuízos que geraria ao país no longo prazo, e hoje nenhum país civilizado e desenvolvido tem este tipo de tributação pois afugenta investimentos.
Novamente afirmamos que há que se ter coragem para travarmos um diálogo honesto e despido de ideologias. O foco nesse tipo de discussão é também sobre justiça.
E pensamos que o Estado brasileiro deve movimentar-se no sentido de mostrar – interna e externamente – que respeita a atividade empreendedora, sua população e suas peculiaridades como nação única no mundo.
Como conclusão, o que podemos extrair dessa realidade é que o nosso principal foco na construção de um novo Sistema Tributário Nacional é de que essa nova realidade contemple o respeito ao pacto federativo, essencialmente visando acompanhar as mudanças nos cenários econômico e tecnológico mundial.
A valorização da carreira de Auditoria Fiscal Tributária deve ser uma política de Estado, já que os referidos profissionais possuem expertise altamente especializada e são atores proativos no debate e no desenvolvimento de ferramentas que efetivamente podem levar a nação ao novo patamar de desenvolvimento.
A solução tecnologia da nota fiscal eletrônica é só uma dentre as muitas contribuições exemplos que foram e estão sendo construídas juntamente com os mais diversos setores produtos do Brasil.
Pensarmos em uma nova realidade de justiça social, repartição de competências e receitas entre os entes federados conforme suas características, de forma a simplificar a tributação, onerando menos a população.
Ao fim e ao cabo, é essencial que possamos construir um ecossistema de geração de negócios que aproveite nossos potenciais geográficos e tecnológicos. Ao oferecermos mais condições para que a atividade empresarial evolua, gerando empregos, renda e, consequentemente, mais riqueza, quebraremos esse ciclo vicioso para a economia.
A aprovação da reforma tributária representa a grande oportunidade para fazer valer o texto constitucional em seu artigo 6º (a garantida dos direitos sociais como a saúde, ao trabalho, ao lazer, entre outros), mas isso não pode justificar a construção de um modelo de tributação que aperte o torniquete sobre negócios e sobre a classe média, que já suporta a pesada burocracia estatal e a tributação excessiva sobre a renda.
Caso contrário, estaremos eternamente condenando o país ao atraso e subdesenvolvimento.
JURACY SOARES
Doutor em Ciências Jurídicas (UMSA/Arg). Mestre em Controladoria. AFRE/CE. Presidente da Febrafite (Federação Brasileira de Associações de Fiscais de Tributos Estaduais)
SÉRGIO PITANGUEIRAS FURQUIM DE ALMEIDA
Auditor fiscal e vice-presidente do Instituto dos Auditores Fiscais do Estado da Bahia (IAF)
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