A tarefa de zelar pelas receitas de Estados e municípios exige constante vigilância. A dificuldade que o governo federal tem de abrir mão de sua postura centralizadora apresenta recorrentes ameaças ao pacto federativo e a um de seus mais importantes pilares: o federalismo fiscal. Estamos, novamente, diante de uma situação em que ações tomadas à revelia dos entes subnacionais têm impacto negativo sobre os caixas de Estados e municípios.
A proposta de ampliar para R$ 5 mil a faixa de isenção do Imposto de Renda (IR), embora seja uma medida socialmente justa, está sendo construída sem a devida consideração sobre seus efeitos colaterais. Pela regra atual, Estados e municípios ficam com o IR retido na fonte sobre os salários pagos a seus próprios servidores. A isenção proposta extinguiria essa receita automaticamente, nos casos de salários inferiores a R$ 5 mil. É importante destacar que o Atlas do Estado Brasileiro, pesquisa realizada pelo Ipea, aponta que nos Estados, cerca de 66% dos servidores têm salário inferior a R$ 5 mil e, nos municípios, essa faixa chega a 87%.
Com o impacto nessa fonte de receita, o próprio governo federal estima que Estados e municípios terão uma perda anual de arrecadação de R$ 5 bilhões. O Estado de São Paulo seria o mais afetado com a medida, com perda anual estimada em R$ 656 milhões, segundo contas da consultoria da Câmara dos Deputados. Como a União não apresenta nenhuma solução para esta situação – à exceção da vaga promessa de que as perdas serão compensadas pelo aumento do consumo – cabe ao Congresso Nacional propor uma solução.
É preciso um compromisso firme com a preservação do pacto federativo, porque na mesma medida em que os recursos são centralizados, as obrigações de prestação de serviços são descentralizadas, culminando na situação em que os entes subnacionais não têm lastro financeiro para dar conta de suas atribuições. A arrecadação não é um fim em si mesma. Ela sustenta políticas públicas nas áreas mais sensíveis da vida em sociedade. Retirar dos entes federados parte considerável de sua base arrecadatória, sem alternativas claras de recomposição, é fragilizar a capacidade do Estado de prestar serviços públicos ao cidadão.
Qualquer reforma ou alteração em impostos federais com repercussão na base de arrecadação dos entes subnacionais deve, obrigatoriamente, ser construída considerando seus impactos sobre Estados e municípios. Afinal, a federação não é um apêndice da União: é a espinha dorsal da nossa democracia.
postado em 11/08/2025 19:00 / atualizado em 11/08/2025 19:00